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Alguns livros nós apenas lemos e seguimos em frente. Porém, vez ou outra acontece de tropeçarmos em uma obra que nos joga contra a parede e funciona como uma espécie de espelho cru, onde vemos a nós mesmos sem nenhum disfarce.
Foi isso o que aconteceu comigo ao me deparar com a obra de Elena Ferrante.
Aqui, vamos conversar um pouco sobre História do Novo Sobrenome, segundo livro da Tetralogia Napolitana, mas o livro responsável pela minha imersão neste universo foi A Filha Perdida.
Tetralogia Napolitana
A Tetralogia Napolitana narra a história de Elena Grego e Lila Cerullo, que se conheceram aos 8 anos, em meados dos anos 1950, em Nápoles. As duas criam um vínculo forte em que compartilham o amor pelos livros e pelo desejo de uma vida muito maior do que aquela que estaria disponível para as duas, em um bairro conservador e marginalizado, em um momento histórico de muita opressão à classe trabalhadora e, sobretudo, às mulheres.
Elena é uma menina complacente e inteligente, mas que constantemente anseia pela aprovação do outro. Lila é naturalmente talentosa e implacável, alguém que faz o que quer. Em uma decisão que altera completamente o rumo da vida das duas, os pais de Elena concordam em pagar para que ela continue a estudar, mas a família de Lila se recusa.
História do Novo Sobrenome
Logo no início da História do Novo Sobrenome, as ondulações da decisão dos pais das duas amigas não poderiam ser mais óbvias. Elena segue com seus estudos no ensino médio e Lila se casa aos 16 anos com Stefano, o dono da mercearia local que ela despreza.
Ao longo do romance, vemos os destinos das amigas seguirem por caminhos diferentes. Elena tem sua vida amorosa frustrada e se sente intimidada quando começa a frequentar os mesmos locais que as classes educadas da faculdade em Pisa.
Lila se vê presa em uma gaiola vulgar e dourada, cujas grandes ela sacode com a maior intensidade de que é capaz, até que os limites conservadores são rompidos e ela se vê ao lado de um marido violento. Ainda assim, como sempre, Elena se sente ofuscada por Lila, cuja vida parece mais incandescente que a dela. Enquanto Lila inveja a chance da amiga de escapar da mesquinhez e dos ciclos viciosos nos quais elas foram criadas.
A Amiga Genial e História do Novo Sobrenome, bem como A Filha Perdida, trazem a relação entre as mulheres para o foco da narrativa ao mesmo tempo em que explora a relação dessas personagens com o mundo, com o meio no qual estão inseridas e a forma que elas reagem à opressão com todos as ferramentas que conseguirem.
Tudo isso sem ter medo de emoções sombrias, Ferrante captura a mudança desta amizade em toda a sua cumplicidade e competição irregulares, seus ciúmes furiosos e afetos duradouros que constroem pontes indestrutíveis.
Apesar da relação conflituosa, Lila e Lenu sempre estiveram uma ao lado da outra. Em determinado momento no livro, Elena traz uma reflexão fortíssima compartilhada por Lila:
Pensei: sim, Lila tem razão, a beleza das coisas é um truque, o céu é o trono do medo; estou viva, agora, aqui, a dez passos da água, e isso não é nada belo, é aterrorizante; faço parte, com esta praia, com o mar, com a agitação de todas as formas animais, do terror universal; neste momento sou a partícula infinitesimal por meio da qual o assombro de cada coisa toma consciência de si (…).
Já leu este livro? Conte para gente o que achou!