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A Pior Pessoa do Mundo é um daqueles filmes que despertam em nós uma vontade ainda maior de descobrir quem somos e explorar todas as possibilidades da existência humana.
O que significa, afinal, tornar-se adulto? Qual é o processo? Quando a adolescência realmente termina? E em que momento acaba esse período de indecisão sobre o futuro?
Para as novas gerações, as formas de ser, existir e agir no mundo são tantas que a escolha se torna ainda mais difícil. É um desafio permitir que todas as opções se assentem e, a partir delas, selecionar aquelas que fazem mais sentido no presente.
Nesse contexto, a protagonista de A Pior Pessoa do Mundo, Julie (Renate Reinsve), é retratada como uma “escolhedora em série” — alguém incapaz de ignorar as infinitas possibilidades que se perdem a cada decisão tomada.
Além de um roteiro meticulosamente lapidado, mas que mantém uma naturalidade espontânea, a cinematografia do filme se destaca. Os enquadramentos funcionam como molduras que amplificam as discussões presentes em cada cena. Não se trata apenas do diálogo entre personagens e narrativa, mas também de um convite ao espectador para refletir sobre o que está sendo exibido na tela.
O modo como o filme transita entre diferentes gêneros de forma tão orgânica é outro de seus grandes méritos. A Pior Pessoa do Mundo evolui de uma comédia leve para um drama devastadoramente real de maneira sutil e progressiva.
Ao longo de quatro anos cruciais em seu amadurecimento, acompanhamos Julie em sua jornada de autodescoberta. Ela percebe que seu pai nunca teve real interesse em construir uma relação com ela e, por isso, insistir nessa conexão já não faz sentido. Também entende que não é possível entrar e sair da vida de alguém sem deixar marcas — algumas profundas — e que, da mesma forma, levará consigo cicatrizes de cada encontro e despedida.
No decorrer da sua jornada, Julie também percebe que causou sofrimento a algumas das pessoas que passaram por sua vida e, de alguma forma, busca compensá-las.
Renate Reinsve entrega uma performance brilhante, capturando com precisão e leveza as diferentes facetas da personagem. Julie reconhece seus erros e, ainda assim, em nenhum momento conseguimos vê-la como algo além de vulnerável, imperfeita e profundamente humana.
Como qualquer jovem na casa dos 20 anos, ela teme a terrível irreversibilidade das escolhas de vida.
O diretor Joachim Trier assume o desafio de trabalhar com um dos gêneros mais complexos, o drama romântico, e o combina a outro igualmente difícil — o filme de amadurecimento — para criar algo ao mesmo tempo delicado, intenso e irresistível.
Por que A Pior Pessoa do Mundo?
Apenas alguém que deseja ser bom, que busca agir com generosidade, se arrepende de seus erros e tenta fazer melhor pode se enxergar, ao cometer uma injustiça, como a pior pessoa do mundo.
Talvez o título se aplique ainda mais a Aksel (Anders Danielsen Lie), seu namorado brilhante, porém arrogante — um artista famoso por suas histórias em quadrinhos de teor agressivamente sexual.
Duas cenas merecem destaque especial: a primeira, quando Julie finalmente toma coragem para dizer a Aksel que está terminando o relacionamento. Nesse momento, o mundo ao seu redor parece congelar enquanto ela corre pelas ruas de Oslo ao encontro de Eivind, um rapaz que conheceu em uma festa. A segunda ocorre quando ela finalmente confronta seu pai ausente.
A Pior Pessoa do Mundo é um filme doce, sensível e engraçado de maneiras inesperadas — e, às vezes, dolorosamente real. É o tipo de obra que toca cada espectador de forma diferente, atingindo lugares profundos e íntimos.